Os três principais
movimentos que lideram os protestos anticorrupção – Movimento Brasil Livre
(MBL), Revoltados Online e Vem Pra Rua – não se deixam distrair pelo risco de
serem criticados por uma suposta "indignação seletiva". O objetivo
das manifestações convocadas para este domingo será essencialmente um: derrubar
a presidente Dilma Rousseff .
Apesar do objetivo
comum de derrubar a presidente, as principais lideranças do movimento não têm
consenso sobre qual o caminho a seguir depois disso.
Foto: BBC Brasil.
Nem mesmo os
recentes relatos de delatores do esquema de corrupção da Petrobras de que o
presidente da Câmara, Eduardo Cunha, teria recebido R$ 5 milhões de propina,
fazem os líderes dos protestos titubearem
O peemedebista é
visto como um aliado na implementação de um processo de impeachment e por isso
deve ser poupado no dia 16. É Cunha quem tem o poder de decidir pôr em votação
na Câmara um pedido de impeachment da presidente. "O que nós
concordamos com o Vem para Rua e o Revoltados Online é que o mote geral da
manifestação deve ser realmente o 'Fora Dilma'", afirmou à BBC Brasil
Fábio Ostermann, um dos líderes do MBL.
Para Ostermann,
"misturar as pautas" interessa ao PT, que tenta transformar Cunha num
"bode expiatório". "Claramente, não está funcionando. É
importante ter senso de prioridade nesse momento. Se o presidente da Câmara,
Eduardo Cunha, tiver suas contas a acertar com a Justiça e com a população,
isso vai se dar na hora certa. Certamente não é o dia 16 de agosto",
acrescentou.
O líder do Revoltados
Online, Marcello Reis, vai na mesma linha. Ele diz que nenhum político corrupto
será poupado pelo movimento, mas que no momento o foco é no governo
federal. "Não queremos passar o vagão na frente da locomotiva. Então,
todas as conversas que tivemos com Cunha sempre foram pela apresentação do
impeachment (de Dilma). É um protesto específico pela saída da presidente,
seja (por meio de) impeachment, cassação ou renúncia", disse, resumindo o
objetivo do dia 16.
Rogério Chequer, do
Vem pra Rua, afirma que as manifestações se concentram no impeachment e no fim
da corrupção, mas que devem atingir com mais força os petistas. "Eu
acho que as críticas vão ser maiores na relação com os fatos que têm sido
revelados e comprovados. O PT já foi condenado por caso de 2005
(Mensalão)."
Apesar da oposição
declarada ao governo Dilma, Cunha tem declarado publicamente que não vê base
jurídica para o impeachment, até mesmo se o Tribunal de Contas da União
recomendar a rejeição das contas federais de 2014. Isso porque agora trata-se
de um novo mandato da presidente.
Os movimentos
contam com as mobilizações de domingo para mudar esse
quadro. "Acredito que o dia 16 vai mudar o quadro político. Se for
maior que os protestos de março, político tem medo do povo. Com certeza na
semana seguinte teremos novidade, ou o Cunha vai votar o impeachment ou a Dilma
vai baixar a crista e renunciar", defende Reis.
E o depois?
Apesar do objetivo
comum de derrubar a presidente, as principais lideranças do movimento não têm
consenso sobre qual o caminho a seguir depois disso.
Reis, do Revoltados
Online, diz que, caso o vice-presidente, Michel Temer, assuma no lugar de Dilma
Rousseff, o movimento também pedirá seu impeachment. "Acredito que
Temer seja cúmplice de todos os roubos do PT. O PMDB não está livre da culpa,
não. Caso venha uma estratégia de sair Dilma Rousseff e entrar Temer, nós
também vamos pleitear a saída do Temer", disse. Já Ostermann, do MBL,
e Chequer, do Vem Pra Rua, dizem que Temer seria a saída
"constitucional".
Eles não apostam no
caminho de uma cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE (Tribunal Superior
Eleitoral), porque o julgamento das contas da campanha eleitoral da chapa
petista tende a ser um processo longo, dada a possibilidade de recursos que o
direito à defesa garante.
Se a chapa fosse
cassada com menos de dois anos de mandato, novas eleições seriam convocadas.
Esse é o cenário preferido do senador tucano, Aécio Neves, que acredita que
ganharia um novo pleito, após ter sido derrotado na eleição de 2014.
"Nós temos que
ir para a solução constitucional. Não acho que é questão de apoiar o Temer ou
não, é o que temos para hoje, por causa da Constituição. Nós vamos respeitá-la.
O que o Temer vai fazer, eu não sei. A gente vai ver o que ele vai fazer",
disse Chequer.
"Você vai me
perguntar: você gosta do Temer, apoia o Temer? Claro que não. Até porque quem
elegeu o Temer vice foram as mesmas pessoas que elegeram a Dilma. Mas nós temos
o procedimento constitucional que precisa ser respeitado", afirma
Ostermann, para quem Aécio está sendo "oportunista".
Apesar de não
declararem apoio à estratégia do presidente do PSDB, os líderes dos movimentos
veem com bons olhos o apoio do partido às manifestações. A legenda está
usando as inserções a que tem direito na rede aberta de TV para convocar a
população para o protesto do dia 16 – mas sem fazer referência aos pedidos de
impeachment.
As lideranças
tucanas estão divididas sobre a questão, e por isso o partido não se manifestou
oficialmente a favor da medida. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o
governador de São Paulo Geraldo Alckmin são contra.
Alckmin está mais
interessado em disputar as eleições para presidente de 2018 contra o PT. Já
Serra, embora não tenha se posicionado publicamente, estaria articulando
assumir como ministro na Fazenda num eventual governo Temer.
As lideranças do
PSDB na Câmara e no Senado, o deputado Carlos Sampaio e o senador Cássio Cunha
Lima, têm se manifestado abertamente pela saída da presidente. Ambos são
alinhados com Aécio.
"Amigos, dia
16 de agosto, vamos voltar às ruas de todo o país não mais para protestar e
exigir mudanças. Agora vamos pedir o impeachment da Dilma (sic) responsável
maior por um governo corrupto, mentiroso e incompetente!", escreveu
Sampaio no Facebook, dia 23 de julho.
Contra Dilma ou contra todos?
Apesar do forte
discurso anticorrupção, as manifestações tem apresentado um claro viés
antigoverno e anti-PT desde as primeiras edições em março e abril, acredita
Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da
USP. Ele vem acompanhando de perto os protestos realizados de São Paulo e
conduziu uma pesquisa sobre os manifestantes que compareceram à Avenida
Paulista em abril.
Os questionários
revelaram um forte sentimento contra o sistema político em geral, mas que acaba
sendo verbalizado com mais força contra o governo federal. Entre os
entrevistados, 73% disseram não confiar em qualquer partido. "Esse
caráter antigoverno já estava muito marcado nos dois primeiros protestos. A
corrupção era um motivo pelo qual ele era antigoverno", notou.
"Nossa
pesquisa apontou para uma descrença muito generalizada no sistema político, mas
tendo foco específico no governo federal como uma exemplificação máxima desse
desgaste da representação política."
Por causa disso,
observa Ortellado, as lideranças dos protestos "tentam desenhar essa
tática de desgastar a Dilma por meio do Cunha, um político sobre quem recaem
mais suspeitas de corrupção do que sobre ela".
Para o cientista
político da USP Álvaro Moisés, é natural que o governo federal e a presidente
sejam os principais alvos dos protestos.
"Em qualquer
situação política no Brasil, o foco principal é o governo. O Executivo é quem
tem mais poder, tem uma máquina administrativa inteira a seu dispor. É claro
que, quando você tem o crescimento de uma perspectiva antipolítica, o primeiro
lugar que o protesto foca é o Executivo, é natural", afirma.
"Não acho que
seja uma escolha seletiva: vamos focar na presidente mas não vamos focar no
presidente da Câmara. É evidente que quem está no governo central tem muito
mais exposição do que quem está em cargos que, embora importantes, têm menos
visibilidade", acrescentou.(Notícias Terra)
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